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24 de junho de 2020STF - Exigência de comum acordo para ajuizamento de dissídio coletivo é constitucional
Senhor Presidente,
O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), em sessão virtual realizada entre os dias 22 a 28.5.2020, julgou constitucional dispositivo da Reforma do Judiciário (Emenda Constitucional nº 45/2004) que exige a anuência mútua das partes para o ajuizamento de dissídio coletivo trabalhista (comum acordo) e atribui legitimidade ao Ministério Público do Trabalho (MPT) para ajuizar o dissídio em caso de greve em atividades essenciais. A decisão, por maioria de votos, se deu no julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) nºs 3392, 3423, 3431, 3432 e 3520, que teve como relator o Ministro Gilmar Mendes que, em suma, entendeu não haver nas disposições qualquer violação às cláusulas pétreas da Constituição Federal.
As medidas foram incluídas pela Emenda Constitucional nº 45/2003, nos parágrafos 2º e 3º do artigo 114 da Constituição Federal, que trata da competência da Justiça do Trabalho, e teve como um de seus objetivos diminuir o poder normativo da Justiça do Trabalho e privilegiar a autocomposição.
O Relator lembrou que, de acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a melhor forma de composição na resolução de conflitos coletivos deve privilegiar a normatização autônoma, evitando a imposição do poder estatal. “No contexto brasileiro, isso significa enfraquecer o poder normativo que era dado à Justiça do Trabalho e expandir os meios alternativos de pacificação, como a mediação e a arbitragem, mesmo que estatal”. “A jurisprudência do STF, inclusive, destaca a importância dos acordos coletivos na Justiça do Trabalho e da autocomposição dos conflitos trabalhistas”.
Sobre a alegação de que a emenda teria retirado a legitimidade das entidades sindicais para propor dissídios coletivos, o ministro Gilmar Mendes frisou que o parágrafo 3º do artigo 114 da Constituição é claro ao afirmar que o MPT poderá ajuizar dissídio coletivo em caso de greve em atividade essencial com possibilidade de lesão do interesse público. “Não há que se falar, portanto, em supressão de competências de entidades sindicais”, ressaltou. “Em verdade, a norma traz uma garantia de pacificação de conflitos no caso de greve em atividades essenciais, de modo a privilegiar a paz social”. Ainda de acordo com o ministro, a alteração não impede o acesso à Justiça.
http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=444672&ori=1
Seguem abaixo os links de acesso a cada processo:
ADI 3392
http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=2267506
ADI 3423
http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=11234
ADI 3431
http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=2278650
ADI 3432
http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=2279633
ADI 3520
http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=2303357
O Relator considerou que a exigência de comum acordo para o ajuizamento do dissídio coletivo consubstancia “norma de procedimento”; “condição da ação” e não “barreira a afastar a atuação da jurisdição”. Sustentou ainda, que o ajuizamento de dissídio coletivo representava a incapacidade das partes de chegarem a um acordo por meio de diálogo, sendo, portanto, a última alternativa, fazendo com que o Estado interviesse e impusesse novas normas à relação estabelecida entre as partes (poder normativo). Para ele, um dos objetivos da EC 45/2004, foi, justamente, diminuir o poder normativo da Justiça do Trabalho e privilegiar a autocomposição, tendo ressaltado que a redação dada não impede o acesso do jurisdicionado à Justiça, não vendo qualquer ofensa aos princípios da inafastabilidade jurisdicional e do contraditório.
Os temas (comum acordo para instauração de dissídio coletivo e poder normativo da justiça do trabalho foram, durante anos, um dos mais polêmicos no âmbito das relações do trabalho. O poder normativo da Justiça do Trabalho, especificamente, por ser, por assim dizer, uma espécie de “jabuticaba”, no sentido de que era algo bem brasileiro (ainda que não fosse uma exclusividade nossa) sempre foi objeto de grandes debates. É do professor Amauri Mascaro Nascimento a melhor definição que encontramos: “é a competência constitucional dos tribunais do trabalho para proferir decisões nos processos de dissídios econômicos, criando condições de trabalho com força obrigatória”. (Amauri Mascaro Nascimento, Curso de Direito Processual do Trabalho, 21ª ed., São Paulo: Saraiva, 2002, p. 633-634). Para muitos, tal princípio era difícil de se assimilar, até por conta da essência da divisão dos poderes. Afinal, a edição de leis cabe ao Legislativo. A cargo do Judiciário cabe sua interpretação e aplicação. O poder normativo subvertia, de certa forma, esse princípio. Depois da EC 45, não mais.
Agora, após a manifestação do STF não há mais dúvida possível. Ainda que não tenha havido a decretação de repercussão geral, a questão se encontra pacificada.
Até hoje alguns Tribunais Regionais do Trabalho ainda desconsideravam a exigência do comum acordo para o ajuizamento de dissídio coletivo. Cabia à parte recorrer ao TST que, constatando a ausência do requisito, acabava por extinguir o processo sem julgamento do mérito.
Agora, entendemos que a postura dos regionais tende a mudar em face da manifestação da Corte Maior, ainda que muito se falará em face da polêmica do tema.
O fato é que a decisão não poderia estar melhor alinhada com o princípio norteador da Reforma Trabalhista, que privilegiou a negociação. E mais. Tal decisão vai fomentar ainda mais o procedimento arbitral. Mesmo sem tradição nesse campo, as partes e as próprias instituições vão ter que se adaptar. Em uma palavra, daqui para a frente, ou as questões entre capital e trabalho se resolvem na mesa de negociação ou simplesmente não se resolvem.
Assessoria Técnica.
Fonte: Mix Legal 167/20 – FECOMÉRCIO – SP